domingo, 25 de fevereiro de 2018

O LIVRO E A AMÉRICA




    O Livro e a AméricaTalhado para as grandezas, 
    Pra crescer, criar, subir, 
    O Novo Mundo nos músculos 
    Sente a seiva do porvir. 
    — Estatuário de colossos — 
    Cansado doutros esboços 
    Disse um dia Jeová: 
    "Vai, Colombo, abre a cortina 
    "Da minha eterna oficina... 
    "Tira a América de lá".
    Molhado inda do dilúvio, 
    Qual Tritão descomunal, 
    O continente desperta 
    No concerto universal. 
    Dos oceanos em tropa 
    Um — traz-lhe as artes da Europa, 
    Outro — as bagas de Ceilão... 
    E os Andes petrificados, 
    Como braços levantados, 
    Lhe apontam para a amplidão.
    Olhando em torno então brada: 
    "Tudo marcha!... Ó grande Deus! 
    As cataratas — pra terra, 
    As estrelas — para os céus 
    Lá, do pólo sobre as plagas, 
    O seu rebanho de vagas 
    Vai o mar apascentar... 
    Eu quero marchar com os ventos, 
    Corn os mundos... co'os 
    firmamentos!!!" 
    E Deus responde — "Marchar!" 
    > 
    "Marchar! ... Mas como?...  Da Grécia 
    Nos dóricos Partenons 
    A mil deuses levantando 
    Mil marmóreos Panteon?... 
    Marchar co'a espada de Roma 
    — Leoa de ruiva coma 
    De presa enorme no chão, 
    Saciando o ódio profundo. . . 
    — Com as garras nas mãos do mundo,
    — Com os dentes no coração?... 
    "Marchar!... Mas como a Alemanha 
    Na tirania feudal, 
    Levantando uma montanha 
    Em cada uma catedral?... 
    Não!... Nem templos feitos de ossos, 
    Nem gládios a cavar fossos 
    São degraus do progredir... 
    Lá brada César morrendo: 
    "No pugilato tremendo 
    "Quem sempre vence é o porvir!"
    Filhos do sec’lo das luzes! 
    Filhos da Grande nação! 
    Quando ante Deus vos mostrardes, 
    Tereis um livro na mão: 
    O livro — esse audaz guerreiro 
    Que conquista o mundo inteiro 
    Sem nunca ter Waterloo... 
    Eólo de pensamentos, 
    Que abrira a gruta dos ventos 
    Donde a Igualdade vooul...
    Por uma fatalidade 
    Dessas que descem de além, 
    O sec'lo, que viu Colombo, 
    Viu Guttenberg também. 
    Quando no tosco estaleiro 
    Da Alemanha o velho obreiro 
    A ave da imprensa gerou... 
    O Genovês salta os mares... 
    Busca um ninho entre os palmares 
    E a pátria da imprensa achou...
    Por isso na impaciência 
    Desta sede de saber, 
    Como as aves do deserto 
    As almas buscam beber... 
    Oh! Bendito o que semeia 
    Livros... livros à mão cheia... 
    E manda o povo pensar! 
    O livro caindo n'alma 
    É germe — que faz a palma, 
    É chuva — que faz o mar.
    Vós, que o templo das idéias 
    Largo — abris às multidões, 
    Pra o batismo luminoso 
    Das grandes revoluções, 
    Agora que o trem de ferro 
    Acorda o tigre no cerro 
    E espanta os caboclos nus, 
    Fazei desse "rei dos ventos" 
    — Ginete dos pensamentos, 
    — Arauto da grande luz! ...
    Bravo! a quem salva o futuro 
    Fecundando a multidão! ... 
    Num poema amortalhada 
    Nunca morre uma nação. 
    Como Goethe moribundo 
    Brada "Luz!" o Novo Mundo 
    Num brado de Briaréu... 
    Luz! pois, no vale e na serra... 
    Que, se a luz rola na terra, 
    Deus colhe gênios no céu!...
                                                                   Castro Alves 

    Do livro: "Poetas Românticos Brasileiros", vol. I, Editora Lumen, SP, s/

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Um Feliz Dia para todas as Mães guerreiras que por amor aos filhos são capazes de enfrentar o mundo!